quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

O banho

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Hesitei bastante antes de apresentar esse vídeo, mas não resisti. A hesitação tinha a ver com a divulgação ou uso da imagem de uma pessoa real... com que direito eu poderia fazer uma coisa dessas ? Evito imprimir ao blog um caráter confessional (e nem sempre consigo), tendo por justificativa o princípio de que a minha pessoa privada deve ser resguardada. Portanto, com que direito eu poderia divulgar algo sobre outra pessoa privada ?
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Mas, que se dane, trata-se de uma pessoa pequenina, e não tenho nada de dramático a revelar (ainda que essa pessoinha apareça nua na imagem que divulgo !). Trata-se do pequeno R. - como se fossem necessário tantos pudores a essa altura - em uma imagem feita quando ele tinha lá seus sete ou oito meses de idade. Quando recebi esse vídeo por email, não consegui parar de assistí-lo, e mesmo hoje, quando o vejo, é muito difícil me limitar a uma única reprodução.

A cena toda é de uma simplicidade inacreditável. Vejam o vídeo. O pequeno R. toma banho e se concentra na seríssima atividade de bater a mão na água, gesto que ele faz repetidas vezes. Com sua atenção despertada, talvez, por um som ou um movimento, o pequeno olha para o lado e vê uma pessoa, justamente quem o gravava. Trata-se de uma pessoa querida, R. a reconhece e não consegue conter um sorriso imenso. E pronto, acabou a cena.

O que há de tão encantador nessas imagens ? O que me faz assisti-la ininterruptamente, com a mesma concentração do pequeno R. batendo suas mãos na água ? Por que chego à beira das lágrimas quando vejo imagens aparentemente tão banais ?

Porque, na verdade, elas não tem nada de banais. Chamo atenção para o fato de que o nosso pequeno personagem principal está se dedicando a uma experiência importantíssima, bater as mãos na água, que faz parte daquele conjunto de atividades extremamente complexas que realizamos sem parar lá por essa idade. Trata-se, nada mais e nada menos, de apreender formas de espaço e tempo, bem como o movimento das coisas, justamente relacionado a essas variáveis. Durante aquele momento captado na imagem que vemos, o cérebro de R. está em uma atividade intensa, realizando operações provavelmente muito mais complexas do que aquelas que eu realizo enquanto escrevo esse texto ou quando você o lê. Daí a sua concentração e dedicação que o desligam do mundo ao redor.

Porém, na segunda parte do vídeo, o pequeno olha para o lado. É quando podemos perceber a sua interioridade, que também se encontra em construção. Seu sorriso é espontâneo, não tem mediação nenhuma, é pura expressão do afeto, justamente no momento em que esses afetos são construídos. O pequeno R. já consegue reconhecer as pessoas e, quando ele identifica alguém que até o momento foi fonte inesgotável de amor, ele não consegue evitar o sorriso. Trata-se de resposta afetuosa à quem primeiro lhe dedicou o afeto.

Impossível não nos projetarmos no pequeno R. Sua capacidade de concentração em uma atividade simples, e a forma como essa atividade simples o entretém, me faz pensar em nossos vãos divertimentos. Penso na complexidade inútil dos aparelhos eletrônicos e digitais que nos trazem uma infinidade de sons e imagens e que nos ocupam por horas e horas a fio. Notebooks. Celulares. Wii. Playstation. Atualizar redes sociais. Fazer compras. Em 2010, me entretive loucamente com um Fiat Cinquecento. Conheço uma pessoa que se entretém lendo “Mil Platôs” de Delleuze nos intervalos de suas atividades diárias. Não abro mão de me ocupar com essas coisas, mas as imagens de R. me fazem pensar se não estou deixando para trás coisas simples, se não estou me deixando de dar valor para coisas que seriam, por sua simplicidade, mais autênticas, mais reais.
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Mas há algo mais perturbador no vídeo. Todos passamos pelo que o pequenino passou, e aqui me refiro à descoberta dos afetos. Me pergunto o que fazemos com a espontaneidade desses afetos, se eles não acabam submersos em uma rede complexa de jogos sociais e obrigações materiais. O pequeno R. nos lembra que diante das atividades do cotidiano, por mais envolventes que sejam, não existe nenhuma que seja mais intensa que o afeto, e todas essas atividades deveriam ser deixadas de lado, a qualquer momento, e sempre, para podermos responder com um sorriso àqueles que nos amam.

13 comentários:

Sentir disse...

1. Mil Platôs é muito bom. É quase como bater a mão na água. É sim uma descoberta.

2. Não sei qual a última vez que sorri como forma de escape, como explosão da intensidade do meu sentimento interior, o afeto. Realmente é de se questionar a pureza dos sentimentos no nosso dia a dia.

Marília Rezende (Saci) disse...

Hm.. gostei muito do post e do vídeo, que confesso ter revisto algumas vezes. Não deveríamos deixar escapar as coisas simples tão facilmente..

annapark disse...

oun :~

ps. o último parágrafo tinha que ser pessimista né!! hahhaha.

JML disse...

Esse texto permitiu alguns instantes do meu tempo para refletir um pouco sobre a minha vida.
Realmente, conforme nós crescemos, parece que damos menos valor aos que antes satisfaziam a nossa vida.
Lembrei do que Rousseau dizia:'O homem é corrompido pela sociedade'. Por um lado parece que ele tinha a razão.
Nós vivemos tão oculpados que nem temos tempo de reletir um pouco da nossa própria vida. Mas ao ler esse texto reservei um tempo, assistindo várias vezes o vídeo desse pequeno menino R, para refletir um pouco sobre a mim mesmo.
Mas como é bom simplesmenste fica parado se refletindo, não é não?

ah?! advinhou quem sou eu??
deu para advinhas.. com esse erro de português.. né??
sou uma das mafias coreanas que ainda não domino língua portuguesa.
Sabi quem é.. né? hoho^^

Emy disse...

"Nhooo, ele é tão sensível!!!". Ahan, só se for o R.-zinho.

Unknown disse...

Nessa idade de R.,há uma descoberta atrás da outra né?!
Pena que depois aprendemos a ser hipócritas e o sorriso passa a ser usado para tudo.Menos para demonstrar afeto.

Mariane disse...

Janjão!

adorei o video!
sobre seu texto e a parte de se entreter com coisas simples, não vejo mta diferença entre se entreter com um playstation ou bater a mão na água, acho q só é um problema quando a gente depende só do playstation ou só da água pra se entreter
mas sei lá, sobre o afeto, é triste mesmo a gente acabar escondendo ele, e pior q parece q pra alguns demonstração de afeto é se mostrar inferior, ñ sei se é mta viagem mas tenho essa impressão as vezes...
tipo, se na banheira estivesse um adulto e ñ um bebê, o adulto provavelmente olharia e ñ sorriria, ou nem olharia, mesmo sentindo a msm coisa

Anônimo disse...

Adorei Gian...e concordo com você, às vezes simplesmente não nos damos conta do quão importante são as pessoas que nos rodeiam, aquelas que nos dedicam carinho e atenção.
Esquisito é pensar que já fomos que nem o pequeno R., mas um dia é ele que será como nós...

Honey and Milk disse...

Tem horas que eu penso nisso sabe...
As pessoas meio que buscam eternamente uma felicidade completa, em todos os campos da vida..
Mas é em pequenos momentos do dia que você encontra a genuína felicidade...
Tipo quando voce ta com muita sede e ganha de alguem uma garrafa de água gelada, quando voce ta na estrada e abre o vidro do carro pra sentir o vento ou até quando você sai da fuvest e volta correndo(literalmente) pra casa simplesmente por se sentir livre e feliz...
Pra mim, o R.zinho sentiu a felicidade extrema ao descobrir o movimento da água e encontra o reconhecimento no olhar da pessoa que o filmava...
Dai o sorriso espontâneo...que é o que mais falta nos adultos...

Sei la... brisei

hahahaha
beeijo janjão

barbarafnadaleto disse...

Adorei o post, Gian!
Acho que é justamente essa pureza, essa maneira com que os bebês se deslumbram com o mundo ao seu redor, que atrai nossa atenção para essas criaturinhas :)
Eu estava, ontem, no shopping aqui de Jaú, comendo sashimi e discutindo a vida com minhas amigas do colégio que há muito não via. A conversa foi interrompida por um garotinho, como R., fascinado pelo brilho metálico da fivela da minha bolsa, pendurada na cadeira. Ele sorria ao tocá-la, e sorriu mais ainda o ver que todas sorríamos ao vê-lo.
Até que o jovem pai levou-o para a sua mesa, interrompendo o momento de diversão do pequenino.
Acho que, com a idade, nos acostumamos com o mundo ao nosso redor. Tudo que, aos 2 ou 3 anos, nos era inédito, torna-se óbvio. As coisas não brilham tanto quanto antes.
Mas.. sei lá.. acho que ainda há um quê de bebê em nós. No simples ato de pararmos para assisitir o sol se pôr, por 5 minutos..
Acho que, principalmente quando estamos sozinhos, somos capazes de nos deslumbrar com as coisas a que estamos acostumados.
Whatever..

Beijos, Gian.

Unknown disse...

Esses momentos são fascinantes, especialmente quando essas pessoinhas são "nossas". Larga-se tudo para observar essa simplicidade e, de alguma forma, há uma redescoberta dos afetos. Tenho uma coleção desses vídeos da minha pequena L. Espero poder recorrer a eles quando ela estiver entretida com seu Wii, seu Delleuze ou seu Cinquecento (!).

Unknown disse...

Chorei!
Esse é o sorriso mais lindo do mundo :)
Bjs

Jéssica Beatriz disse...

Gian, esse bebê me lembra alguém... mas não sei dizer quem...
hum
algo como "momento mágico da aula" te lembra alguém?
rsrsrs

bjoo