É o mesmo caso de banheiro-público: uma
contradição de termos. Foi em algum momento da década de 1990 que surgiram os
primeiros “botecos-chiques” em São Paulo. De imediato, ironizei: como diabos um
boteco pode ser chique ? Os dois conceitos me pareciam excludentes e a ideia,
como um todo, uma falsificação. Para coroar minha indignação, e reforçando a
defesa dos bares bons e sem frescura, formulei um princípio: quanto melhor o
bar, pior o banheiro.
Claro, foi um erro. Em pouco tempo,
percebi que o conceito de boteco-chique incluía coisas como, por exemplo, um
cuidado excepcional na conservação e serviço do chopp pedido. Jovens leitores
nem imaginam o abismo que separa o padrão do chopp de hoje com o de uns vinte
anos atrás. Por exemplo, outrora o chopp era coroado por uma espuma pouco espessa e sem gosto, o que
acabou gerando o hábito nacional de pedir chopp sem colarinho. Hoje em dia, o
normal é um generoso e saboroso creme
espesso, que deixam um bigode feliz no rosto alegre do bebum.
Mesmo frequentando os botecos-chiques, o
princípio relativo aos bares permaneceu, e logo comecei a recolher lembranças de banheiros cujo
decrepitude chegava ao ponto do pitoresco. Por exemplo, os do inesquecível Champion,
um daqueles restaurantes chineses da Liberdade que nos ajudam a conhecer uma deliciosa culinária chinesa, baseada em frutos do mar e muito além dos afamados rolinhos
primavera e frangos xadrez, deus-nos-livre. Em episódio devidamente registrado
pela imprensa, um caranguejo foi encontrado passeando pelos seus banheiros. Ou aqueles
Cafés parisienses, alguns excepcionalmente charmosos, mas que fazem questão de
manter as históricas “privadas turcas”, tão arcaicas, tão anti-higiênicas, tão
francesas.
Na minha memória, há um lugar reservado
para o bar do querido Ezequiel, de Ouro Preto, um estabelecimento absolutamente
precário tocado por sua irmã, Celita, na garagem da casa onde moram. Servindo cerveja e
suas deliciosas cachaças artesanais – “temperadas”
com mel, chocolate ou ervas – Ezequiel decidiu anos atrás construir um banheiro
anexo à sua garagem, talvez para poupar o muro dos vizinhos. No cubículo em que
mal se consegue permanecer em pé e mover a porta ao mesmo tempo, o simpático
barman instalou uma pia, uma privada e, sem ter como encaixar a caixa d’água no
pequeno espaço, instalou-a do lado de fora, ao ar livre, com seu acionamento
sendo possível apenas estendendo-se a mão para fora da janela (um dos vidros da
janela foi propositalmente quebrado para permitir a manobra, veja a foto
acima).
Mas,
o meu campeão na série banheiros pitorescos em todos os tempos foi o do velho Duarte, quando ainda
mantinha seu estabelecimento ao lado do Anglo. Pois em uma das poucas
vezes que fui até seu bar, tomei um par de cervejas, quis ir ao banheiro e logo vi a placa pendurada na porta, “Banheiro Quebrado”. Falei, “Pô, Duarte,
e agora, como vou fazer ?”. Ao que o bravo bartender respondeu, me estendendo as
chaves: “Que é isso, professor, pode ir. Eu só pus a placa pra desencorajar o
uso”.
Um comentário:
rs! Já eu mensuro o bar pelo tipo de mesa!
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