terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Uma citação


A multiplicidade dos professores era surpreendente; é a primeira diversidade de que se é consciente na vida. Que eles ficassem tanto tempo parados à nossa frente, expostos em cada um de seus movimentos, sob incessante observação, hora após hora o verdadeiro objeto do nosso interesse, sem poderem se afastar durante um tempo precisamente delimitado; a sua superioridade, que não queremos reconhecer de uma vez por todas e que nos torna perspicazes, críticos e maliciosos; a necessidade de acompanhá-los sem que queiramos nos esforçar demais, pois ainda não nos tornamos trabalhadores dedicados e exclusivos; também o mistério que envolve sua vida fora da escola, quando não estão à nossa frente como atores, representando a si próprios; e, mais ainda, a alternância dos personagens, um após outro, no mesmo papel, no mesmo lugar e com a mesma intenção, portanto, eminentemente comparáveis - tudo isso, em seu efeito conjunto, é outra escola, bem diferente da escola formal, uma escola que ensina a diversidade dos seres humanos; se a tomarmos um pouco a sério, resulta na primeira escola em que conscientemente estudamos o homem.


Elias Canetti, A língua absolvida. O texto me chamou atenção de um jeito peculiar: despertou lembranças de quando era aluno.

3 comentários:

Lucas Bispo disse...

"tudo isso, em seu efeito conjunto, é outra escola, bem diferente da escola formal, uma escola que ensina a diversidade dos seres humanos;"

Talvez não seja tão diferente do que aprendemos em um ano de cursinho. Depois que o ano acaba é que você para pra pensar o quanto o ano foi produtivo, e, talvez, essa produção não seja apenas nos estudos...

Gian disse...

Essa sempre foi minha convicção mais íntima, meu caro Lucas.

Gabriel disse...

"talvez" não, de fato é. Quem tem mais de um ano de cursinho sabe o quanto de [b]maturidade[/b] se adquire nesse período (que os parentes amigos insistem em chamar de "ano perdido", ou "tempo jogado no lixo").